Em meus textos sobre as questões, por assim dizer, políticas de Barreiras, tenho tentado refletir a partir de dois pressupostos. O primeiro é que a profusão de problemas e o caos em que está mergulhada a cidade resultam de um período longo de administrações ruins; o segundo é que o discurso de criação do estado do Rio São Francisco caiu como uma luva para justificar esse caos. Vou começar pelo segundo ponto, pois terei de ser breve, dada a insistência com que trato da questão. O desmembramento da região Oeste tem como um de seus princípios de justificação a ideia de que não recebemos a atenção devida. Isso, desde logo, serve para encobrir e maquiar toda a incompetência das administrações locais. No fim das contas, o discurso de emancipação causa uma ilusão ótica, pois a visão não consegue perceber as coisas como elas são. Assim, diante de um buraco na rua, o olhar se volta para o governo estadual em busca do culpado. Minha tese, portanto, é a de que os verdadeiros problemas têm origem, antes de tudo, no abandono local, não estadual. Volto, com isso, ao primeiro ponto.
O ICADS está sem aulas desde o dia 12 de março. Logo completaremos dois meses de paralisação. A ação da prefeitura até o momento resumiu-se a fazer um conserto que de nada serviu. Isso porque o CREA emitiu um laudo apontando todos os problemas da ponte, e os reparos feitos, embora fizessem consertos nos problemas apontados pelo Conselho, não tiveram sua eficácia atestada pelos responsáveis da prefeitura. Em outras palavras, a prefeitura agiu da seguinte forma: reparamos os problemas, mas não garantimos a qualidade do trabalho, tampouco a segurança. Diante disso, uma comissão de professores e alunos fez uma peregrinação a Salvador, em 19 e 20 de abril, reunindo-se com o Reitor da UFBA, a secretária do Governador e deputados da Assembléia Legislativa. Ou seja, fizeram o trabalho que competia à prefeitura municipal. Depois dessas reuniões, um novo diálogo teve início, e o DERBA, órgão estadual, a partir de agora vai ajudar na resolução dos problemas, fazendo finalmente um conserto que garanta o que a prefeitura não garantiu. A reunião dos professores e alunos também conseguiu garantir um indicativo de que finalmente a ponte de concreto será construída com verbas estaduais. Estamos ou não estamos diante de um caso de má administração municipal? Se o município de Barreiras não tem recursos para pavimentar o acesso à UFBA, isso só demonstra os problemas locais e a incapacidade das pessoas que estão no comando, pois só isso justifica a falta de recursos para o investimento.
Como é costume local, houve a tentativa de transferir responsabilidades. Com efeito, duas objeções foram feitas para eximir a prefeitura de sua responsabilidade. Mas, por um efeito inverso ao desejado, ambas justamente realçam a incompetência administrativa. Falou-se, primeiramente, que a culpa era de quem havia mandado a UFBA para a Prainha, e, a seguir, que a própria universidade tinha seu quinhão de responsabilidade, pois além de aceitar instalar-se naquela localidade, acabou por levar centenas de estudantes para ter aulas onde não havia condições.
Se tivéssemos um debate político qualificado em Barreiras, essas objeções não precisariam ser levadas a sério. Mas o pior é que elas ainda surtem os efeitos desejados por aqueles que enunciam disparates retóricos e demagógicos como estes. Por isso, é preciso desfazer o nós desse novelo. Quando administradores dizem que não podem responsabilizar-se por problemas que herdaram da gestão anterior, isso significa a pá de cal, o atestado de óbito do município. Numa cidade que agoniza, como é o caso de Barreiras, é o que há de mais catastrófico. Partindo desse raciocínio, quando um morador da periferia, que vive em meio à lama, ao esgoto, aos ratos, ao lixo, à falta de luz, à falta de transporte decente, reclamar por qualquer melhoria, vai ouvir do administrador: não tenho nada a ver com isso, esses problemas existiam antes de eu assumir o poder. E, o que é pior, seguindo as mesmas justificativas que foram arroladas no caso da UFBA, esse possível morador ainda vai ouvir: a culpa é sua, pois quem mandou morar lá.
Analisemos esse último argumento no que ele diz respeito ao caso da UFBA. Atribuir responsabilidade à universidade por ela ter-se instalado na Prainha parte do pressuposto de que, para suas instalações, outro lugar poderia ter sido destinado. Hoje, após quase quatro anos em Barreiras, seria possível que, conhecendo a realidade política local, os professores que aqui estão não aceitassem a área depois do Rio de Ondas para lá construir os novos prédios. Todos já estariam informados o bastante para saber que não se pode confiar que uma ponte seria construída; tampouco que internet, energia, água encanada chegariam lá facilmente. Mas a universidade veio para cá antes de todos os professores que hoje estão aí. E as pessoas que estiveram à frente para instalar a UFBA aqui não sabiam de todos esses problemas e dificuldades. Caímos, portanto, num círculo vicioso, na medida em que só poderíamos ter evitado a Prainha se já conhecêssemos como é a política local, mas só conhecemos a política local, obviamente, depois que chegamos aqui. E a vinda da UFBA para cá já estava condicionada por aquilo que havia sido decidido politicamente.
Ainda assim, uma questão se impõe. Vamos supor que a UFBA tivesse condições de funcionar no Colégio Padre Vieira até o momento, e que só a partir de agora devesse ser escolhido ou negociado uma nova área para a necessária expansão do Campus. Os professores que já conhecem suficientemente a vida política barreirense, após analisar possíveis locais, deixariam de escolher a Prainha por antever todas as dificuldades? Evitar atravessar o rio porque a prefeitura se recusaria a construir uma ponte e oferecer acesso seguro seria a resolução mais correta? Se assim agisse, a Universidade não estaria sendo mesquinha e pequena ao aceitar as regras de tal jogo? Ora, o próprio movimento iniciado em 12 de março comprova precisamente o contrário. Caberia aqui, nessa relação entre Universidade e política local, uma sentença de Jean Piaget: “Quando o coelho come alface, é a alface que vira coelho, não o coelho que vira alface”.
O ICADS está sem aulas desde o dia 12 de março. Logo completaremos dois meses de paralisação. A ação da prefeitura até o momento resumiu-se a fazer um conserto que de nada serviu. Isso porque o CREA emitiu um laudo apontando todos os problemas da ponte, e os reparos feitos, embora fizessem consertos nos problemas apontados pelo Conselho, não tiveram sua eficácia atestada pelos responsáveis da prefeitura. Em outras palavras, a prefeitura agiu da seguinte forma: reparamos os problemas, mas não garantimos a qualidade do trabalho, tampouco a segurança. Diante disso, uma comissão de professores e alunos fez uma peregrinação a Salvador, em 19 e 20 de abril, reunindo-se com o Reitor da UFBA, a secretária do Governador e deputados da Assembléia Legislativa. Ou seja, fizeram o trabalho que competia à prefeitura municipal. Depois dessas reuniões, um novo diálogo teve início, e o DERBA, órgão estadual, a partir de agora vai ajudar na resolução dos problemas, fazendo finalmente um conserto que garanta o que a prefeitura não garantiu. A reunião dos professores e alunos também conseguiu garantir um indicativo de que finalmente a ponte de concreto será construída com verbas estaduais. Estamos ou não estamos diante de um caso de má administração municipal? Se o município de Barreiras não tem recursos para pavimentar o acesso à UFBA, isso só demonstra os problemas locais e a incapacidade das pessoas que estão no comando, pois só isso justifica a falta de recursos para o investimento.
Como é costume local, houve a tentativa de transferir responsabilidades. Com efeito, duas objeções foram feitas para eximir a prefeitura de sua responsabilidade. Mas, por um efeito inverso ao desejado, ambas justamente realçam a incompetência administrativa. Falou-se, primeiramente, que a culpa era de quem havia mandado a UFBA para a Prainha, e, a seguir, que a própria universidade tinha seu quinhão de responsabilidade, pois além de aceitar instalar-se naquela localidade, acabou por levar centenas de estudantes para ter aulas onde não havia condições.
Se tivéssemos um debate político qualificado em Barreiras, essas objeções não precisariam ser levadas a sério. Mas o pior é que elas ainda surtem os efeitos desejados por aqueles que enunciam disparates retóricos e demagógicos como estes. Por isso, é preciso desfazer o nós desse novelo. Quando administradores dizem que não podem responsabilizar-se por problemas que herdaram da gestão anterior, isso significa a pá de cal, o atestado de óbito do município. Numa cidade que agoniza, como é o caso de Barreiras, é o que há de mais catastrófico. Partindo desse raciocínio, quando um morador da periferia, que vive em meio à lama, ao esgoto, aos ratos, ao lixo, à falta de luz, à falta de transporte decente, reclamar por qualquer melhoria, vai ouvir do administrador: não tenho nada a ver com isso, esses problemas existiam antes de eu assumir o poder. E, o que é pior, seguindo as mesmas justificativas que foram arroladas no caso da UFBA, esse possível morador ainda vai ouvir: a culpa é sua, pois quem mandou morar lá.
Analisemos esse último argumento no que ele diz respeito ao caso da UFBA. Atribuir responsabilidade à universidade por ela ter-se instalado na Prainha parte do pressuposto de que, para suas instalações, outro lugar poderia ter sido destinado. Hoje, após quase quatro anos em Barreiras, seria possível que, conhecendo a realidade política local, os professores que aqui estão não aceitassem a área depois do Rio de Ondas para lá construir os novos prédios. Todos já estariam informados o bastante para saber que não se pode confiar que uma ponte seria construída; tampouco que internet, energia, água encanada chegariam lá facilmente. Mas a universidade veio para cá antes de todos os professores que hoje estão aí. E as pessoas que estiveram à frente para instalar a UFBA aqui não sabiam de todos esses problemas e dificuldades. Caímos, portanto, num círculo vicioso, na medida em que só poderíamos ter evitado a Prainha se já conhecêssemos como é a política local, mas só conhecemos a política local, obviamente, depois que chegamos aqui. E a vinda da UFBA para cá já estava condicionada por aquilo que havia sido decidido politicamente.
Ainda assim, uma questão se impõe. Vamos supor que a UFBA tivesse condições de funcionar no Colégio Padre Vieira até o momento, e que só a partir de agora devesse ser escolhido ou negociado uma nova área para a necessária expansão do Campus. Os professores que já conhecem suficientemente a vida política barreirense, após analisar possíveis locais, deixariam de escolher a Prainha por antever todas as dificuldades? Evitar atravessar o rio porque a prefeitura se recusaria a construir uma ponte e oferecer acesso seguro seria a resolução mais correta? Se assim agisse, a Universidade não estaria sendo mesquinha e pequena ao aceitar as regras de tal jogo? Ora, o próprio movimento iniciado em 12 de março comprova precisamente o contrário. Caberia aqui, nessa relação entre Universidade e política local, uma sentença de Jean Piaget: “Quando o coelho come alface, é a alface que vira coelho, não o coelho que vira alface”.
Por Márcio Lima