segunda-feira, 6 de junho de 2011

"Águia ou galinha: 5 desejos ao PT de Barreiras - mais 1", por Martin Mayr

Caras companheiras, prezados companheiros,

Lembram da "Carta a Dona Lindú”? Frei Betto escreveu-a depois da vitória de Lula, filho de Dona Lindú, nas eleições de 2002. Quantos e quantas se emocionaram e orgulharam com a seguinte passagem:

“Seu filho venceu, dona Lindú. Não porque tirou diploma, ficou rico e famoso. Mas porque construiu o mais combativo e ético partido político do Brasil”.

No entanto, olhando para o Partido dos Trabalhadores de hoje, o citado provoca certo embaraço. Capaz que Dona Lindú virasse no caixão, caso precisasse ouvi-la de novo. O que o filho dela ajudou a construir, apresenta-se hoje como uma agregação altamente arbitrária de figuras e interesses – dos mais nobres até os mais vulgares, sem que o PT os tachasse como tais.

Esta PMDB-zação do PT acontece porque o Partido dos Trabalhadores, com aval do filho de Dona Lindú, vem negligenciar a combatividade e a ética, em prol da excessivamente invocada governabilidade.

Qualquer constrangimento, qualquer contradição em relação ao histórico e aos princípios programáticos do partido recebe respostas do tipo “Nós somos governo”, “Estamos costurando apoios”, “Precisamos ampliar a base”, “Cedemos para somar”, etc.

Sem dúvida, há muitos petistas que vão muito bem assim. Entretanto, o Brasil perdeu. O Brasil perdeu aquela “águia” de combatividade e ética, sobre a qual Frei Betto diz:

“Cortaram as asas da águia, para ela acostumar-se que agora é galinha”.

Reza o Artigo 1º do Estatuto do Partido dos Trabalhadores:

“O Partido dos Trabalhadores (PT) é uma associação voluntária de cidadãs e cidadãos que se propõem a lutar por democracia, pluralidade, solidariedade, transformações políticas, sociais, institucionais, econômicas, jurídicas e culturais, destinadas a eliminar a exploração, a dominação, a opressão, a desigualdade, a injustiça e a miséria, com o objetivo de construir o socialismo democrático.”

Portanto, a razão da existência do PT não é a de governar o Brasil. A razão do ser, pensar e agir do PT é propor um projeto socialista de desenvolvimento que prima pela inclusão social, participação popular, responsabilidade ambiental e solidariedade internacional. Na medida de que o povo aprova a coerência da proposta do PT e enxerga a competência de pô-la em prática, colocará o governo nas mãos do Partido dos Trabalhadores. Governar, portanto, é conseqüência de posições e atitudes - e não preposto delas.

Há vinte anos venho participando das lutas populares na região de Barreiras. Até o ano de 2003, sempre procurei apoiar o PT e ser apoiado por ele. Ser considerado como petista (sem que fosse filiado) me enchia de satisfação. A partir de 2005, comecei a sentir incômodos. Hoje, apesar do meu profundo carinho e apreço por muitos e muitas dos/as filiados/as do PT, temo que a ONG por mim coordenada possa sofrer problemas de reputação caso interaja muito com as ações do Partido dos Trabalhadores.

Contudo, não me conformo com esta situação.

Continuo mantendo a esperança que o Partido dos Trabalhadores - sendo um partido de massa, plural e destituído de espírito sectário - possa achar-se de novo como força combativa e ética.

Diante disto, venho manifestar, com sinceridade e respeito à bandeira petista, cinco desejos (mais um) ao Partido dos Trabalhadores de Barreiras:

1. Volte a ser um partido combativo, posicionando-se diante do crime organizado de Barreiras, denunciando os abusos de autoridade e a desvirtuação de poderes, desmascarando as manipulações e falcatruas com diplomas, habilitações e benefícios sociais, reforçando os clamores nos bairros por condições salutares de vida e convivência, enfileirando-se às marchas contra violência e homofobia, solidarizando-se publicamente com greves de legítimos objetivos, apontando a acumulação desproporcional de riquezas, encarando o debate sobre a criação de um novo estado, reprovando a predominância dos interesses agro-empresariais na região, ...

2. Volte a ser um partido ético que tenha moral a denunciar abusos e desvios, afastando ou ate expulsando filiados/as em funções públicas caso cometerem ilegalidades ou acobertarem as mesmas, primando pela transparência e objetividade na declaração de bens e patrimônio, observando os princípios de objetividade e transparência em processos licitatórios e concursos públicos, recusando amparo partidário para entidades ou movimentos que comprovadamente desobedecem a estes princípios, desautorizando o favorecimento econômico para amigos do partido, expulsando filiados/as que comprovadamente ofendem interesses comuns da comunidade, reprovando prestações de contas de forças aliadas caso constarem irregularidades, rompendo com alianças políticas caso ofenderem os princípios de objetividade e transparência na gestão dos recursos públicos, ...

3. Volte a ser um partido mais modesto, refutando auto-elogios descabidos, ouvindo as opiniões diversas em espaços de aprendizagem, primando por autenticidade no lugar de modismo, buscando o contato pessoal com o povo no lugar de concentrações de massa, marcando presença nos ônibus coletivos, estádios, salas de aula, auditórios de universidades, campos de futebol, romarias, passeatas, forrós nos bairros, evitar o pagamento de taxas para ser estampado/a na mídia, ...

4. Volte a ser um partido mais unido, mantendo uma freqüência regular de reuniões, proporcionando um bom fluxo de comunicação aos/as filiados/as, ampliando a representação partidária em eventos estaduais e nacionais, levando dúvidas e discordâncias para os fóruns internos do partido, evitando fofocas, demonstrando lealdade com a direção do partido, rejeitando a imposição de interesses estratégicos externos sem prévia discussão e aprovação pelo partido local, socorrendo companheiros/as de luta em casos de emergência, prestando solidariedade aos/as companheiros/as em situações de aflição ou luto, ...

5. Volte a ser um partido mais trabalhador(a), enfrentando o pó da estrada, visitando as obras em andamento, vistoriando programas sociais nos bairros e comunidades, agüentando o abafo de auditórios e audiências, pegando a ferramenta para apoiar um mutirão na comunidade, pegando a caneta para escrever uma carta à redação ou um artigo na mídia regional, criando um jornal que seja digna de artigos e comentários sérios sobre o desenvolvimento no Oeste, empenhando-se nas políticas de desenvolvimento regional (Território, Comitê da Bacia Hidrográfica, ...), organizando eventos de distração e lazer sadio para o povo humilde nos bairros e comunidades (forrós nos bairros, “PT Lazer”, serestas tradicionais, ...), mantendo um site atualizado, ...

Avisei que teria mais um desejo. É o mais simples:

Seja um partido menos auto-suficiente. É ridículo gloriar-se a si mesmo e insistir na miserabilidade das demais forças políticas. Bem melhor reconhecer as falhas próprias e procurar consertá-las. Arrogância não combina nem um pouco com o socialismo.

É isso. Nunca é tarde. Pois a luta continua.

Com um abraço forte,
Martin Mayr

quarta-feira, 1 de junho de 2011

"Território brasileiro entregue à dilapidação do capital", por Valney Dias Rigonato

Historicamente o território brasileiro foi explorado, usurpado e, por último, entregue aos interesses do capital globalizado. Há vários agentes agindo em nome desses interesses em nosso país. Esses agentes são: Estado-Nações, Grupos Financeiros, Multinacionais e as ONGs internacionais.

A política administrativa brasileira pouco valoriza as contribuições da ciência e da tecnologia. Há muito conhecimento produzido e desvalorizado pelo poder executivo e legislativo no território brasileiro. No entanto, ainda falta produção científica de ponta a respeito da biodiversidade brasileira. Resultado, inclusive da falta de investimento em pesquisas na educação brasileira básica e superior. Assim, entregamos as nossas potencialidades minerais, a água e a própria biodiversidade do território brasileiro para ser governado “pelos de fora” como já frisou o geógrafo Milton Santos.

Será que é falta de vontade política? Produção de conhecimento? Anemia política? Ou, interesses particulares inseridos nos ministérios, no congresso, no senado, nas assembléias legislativas estaduais e nas câmeras de vereadores? O que os impossibilitam de desenvolver políticas contra a correnteza do capital neoliberal? Com certeza, há uma confluência desses fatores. Afinal, vivemos num país que ignora o conhecimento científico já produzido e que abre concessões para explorar todas as nossas potencialidades territoriais.

Um típico exemplo é a reformulação do código florestal. Nas últimas semanas assistimos um teatro político no qual o que encontra na cena principal da comédia é o nosso meio ambiente. Vários atores representando os interesses de agentes específicos do capital. Por um lado, a banca ruralista faz esforços ímpares para isentar a responsabilidade de alguns proprietários de terras. Por outro, esquecem que o próprio agronegócio motivou várias ebulições no espaço urbano brasileiro e, mormente, crescimento desordenados e impactos ambientais urbanos. Tais impactos aparecem na nova proposta do código florestal enquanto apenas coadjuvantes da grande comédia: o futuro do meio ambiente brasileiro.

Esses atores são dirigidos pela mídia mundial em nome das potências mundiais as quais a tempo elegeram uma máxima: “Os brasileiros não têm competência para gerenciar a Amazônia, o Cerrado, a Mata Atlântica, a Caatinga e outros”. O geógrafo Aziz Ab’Saber em entrevista em 2005 afirmou: há um risco de entregar Amazônia às ONGs internacionais.

Desse modo, é preciso repensar rapidamente de que maneira o Brasil vai enfrentar as novas políticas globalizadas sobre o meio ambiente diante da pressão do capital internacional, do “aquecimento global” e das catástrofes naturais. Além da reforma do código ambiental há também novas concepções de biodiversidade (ALMEIDA, 2008), de natureza e novos interesses em nosso “bio-espaço”, Moreira (2010).

Diante dessa possível agregação de novos valores e concepções ao meio ambiente há várias indagações: a reforma do código florestal atende esses interesses? O Brasil ultrapassará o título de celeiro produtivo de grãos para o novo celeiro de seqüestro de Carbono?

Enfim, o território brasileiro precisa de outro modelo de gestão geopolítico. O Brasil precisa utilizar a ciência e a tecnologia para garantir o manejo integrado dos biomas brasileiros com geração de emprego e renda para sua população. Ou será, que iremos novamente aceitar o modelo de conservação e preservação dos países desenvolvidos? E, mais recentemente do terceiro setor e do chamado capital verde? Há inúmeras estratégias geopolíticas, ou melhor, do raciocínio espacial aplicado à gestão e planejamento político do território brasileiro para (re)constituir a sua autonomia e o controle do mesmo diante das demandas internacionais.

Em síntese, (re) pensar e buscar novas estratégias neste início de século XXI é uma tarefa e uma responsabilidade para a comunidade científica e para a população brasileira diante do ínfimo papel reservado por esse modelo. Contudo, é preciso romper com essa lógica colonialista de governar para entregar. O conhecimento científico e popular podem conquistar novos papéis na sociedade “técnico-científico-informacional”. Para isso, um dos papéis da população brasileira é denunciar e ao governo cabe repensar suas políticas, seu planejamento, sua gestão e seus projetos.

Oxalá, que as riquezas minerais, a biodiversidade e a população brasileira não seja dilapidados pelo capital.

por Valney Dias Rigonato
Professor do curso de Geografia ICADS/UFBA, Campus Barreiras-BA.