sexta-feira, 30 de julho de 2010

"Impressões Alheias", por Márcio Lima

Desde o início de junho, a UFBA passa por mais uma temporada de concursos. Logo Barreiras receberá uma nova safra de aproximadamente vinte docentes. Na última semana, tivemos, dentre outras bancas, uma destinada à Língua Francesa. Montar banca de concursos é uma verdadeira epopeia. A primeira dificuldade é encontrar professores que aceitam compor a banca, e por diversas razões. A seguir, vêm as negociações em torno de uma data comum. Finalmente, correr contra o tempo para comprar passagens de avião. Todas essas questões não raro interferem no planejamento das atividades da Universidade. Como estamos em ano eleitoral, nomeações de concurso público só podiam ser feitas até o final de junho. E, para tanto, só podiam ser nomeados os aprovados em concursos realizados até a segunda semana daquele mês. Dada a urgência de um (a) professor (a) de francês, o concurso deveria ter sido realizado na primeira semana. Como isso não foi possível, a seleção só pôde ser realizada na semana passada. Resultado final: os alunos ficarão um semestre sem aulas de francês.

Compuseram a comissão avaliadora a professora Denise Lavallé da UNEB, Marcel Lavallé, canadense e professor aposentado da Université du Québec à Montréal, além de Dominique Boxus, belga radicado no Brasil e que leciona na Universidade Federal de Sergipe. Quando fiz contato com a professora Denise, a primeira resposta dela foi a tradução mais genuína de sua pessoa, ou seja, da pura simpatia. Mas, além de sinalizar positivamente, ela escreveu-me contando que seu marido havia gostado muito da ideia, sobretudo porque queria conhecer alguns sítios arqueológicos da região. Infelizmente, por conta do aperto das datas, não conseguimos articular um período que permitisse fazer o passeio. Acertamos que todo o processo seletivo seria feito num tempo corrido. Até a realização de fato do concurso, a vinda deles teria como único motivo a seleção pública.

Contudo, se o cronograma parecia não abrir espaço para o passeio, a realidade revelou-se outra. Encontramos, assim, uma manhã para irmos a São Desidério atender ao desejo do professor Marcel. Embora sem a possibilidade do olhar paciente como exige os lugares visitados, tivemos a oportunidade de ver uma pequena série de pinturas rupestres, bem como visitar o Parque Municipal de São Desidério, onde está a sublime Lagoa Azul e a gruta do Catão, clássica no nome, mas barroca nas formas. Desnecessário dizer que todos apreciaram muitíssimo o passeio, muito bem ciceroneado por Juci, guia e proprietário da Rupestre Turismo e, quiçá, futuro estudante do curso de história da UFBA. Espero tê-lo convencido disso. É sempre instigante ver pessoas movidas por um pathos ao conhecimento, integrado plenamente àquilo a que se dedica, sobretudo quando vemos a universidade muitas vezes tomada por um pragmatismo chão que se expressa pela busca tresloucada pelo “diploma”.

No mesmo dia da visita a São Desidério, convidei-os para jantar. Os professores Marcel e Denise, porém, declinaram do convite. Queriam descansar para a viagem do dia seguinte após uma longa jornada de trabalho associada ao passeio, que, sem dúvida, exigiu muito mais esforço físico do que a avaliação do concurso. Por isso, levei apenas Dominique para conhecer a noite barreirense. Primeiro experimentamos o Dom Quixope, cuja altura da música, que impedia qualquer possibilidade de conversa, nos obrigou a “bater em retirada”. Fomos ao Trapiche. Por ser uma quinta, a tranquilidade do lugar nesse dia nos permitiu, enfim, conversar bastante. Numa situação como essa, é inevitável falar da história de Barreiras. E, quando lá fechou, esticamos ainda um pouco no Lavoisier. No dia seguinte, Dominique contava aos outros dois professores suas peripécias, elogiando bastante os bares por que passou. Esses seus comentários foram apenas uma variação do que ele me dissera e o que me motivou a escrever este e outros textos porvir: “vou levar daqui uma impressão muito boa”.

Volto ainda a essas questões.

Por Márcio Lima

segunda-feira, 12 de julho de 2010

"O Que Significam as Atuais Alterações no Plano Diretor de Barreiras? Parte III", por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

Como forma de promover a minimização dos impactos relatados no post anterior, há que se potencializar a criação de áreas verdes intraurbanas como, por exemplo, parques e jardins, além de ações pautadas em um eficiente programa de arborização urbana, com fins ao aumento do conforto térmico e uma melhoria na ambiência urbana. Na Figura 3 observa-se os benefícios da arborização em ambientes urbanos quanto à temperatura.
Figura 3. Benefícios da arborização urbana.

Desta forma, a temperatura da superfície para áreas de concreto e asfalto está em torno de 47º C e 50º C, respectivamente, sendo que para áreas com sombreamento há uma redução expressiva do calor.

Com relação a outra proposta de alteração do PDU de Barreiras (redução de áreas mínimas de lotes) há algumas considerações a serem feitas. Primeiramente, observa-se por meio da Figura 4 o parcelamento do solo do atual PDU, bem como sua proposta de alteração.

Conforme já fora mencionado, a proposta apresentada na Câmara de Vereadores é para que seja reduzida a área mínima dos lotes na cidade Barreiras, dos atuais 360 m² para 125 m².


Figura 4. Formas de parcelamento do solo (atual e proposta).

Hipoteticamente, um conjunto de 12 lotes com dimensões de 12 x 30m (360 m²) foi dividido segundo as sugestões propostas de Câmara dos Vereadores. Nota-se que para a mesma área o número de lotes passou de 12 para 30 lotes com dimensões de 6 x 20,84m (125,04 m²). Com esta nova configuração de dimensões de lotes haverá ainda a modificação dos padrões das quadras, pois não haverá espaços vazios (não ocupados) dentro das quadras. Assim, a modificação poderá ser quanto ao tamanho dos lotes, bem como do dimensionamento das quadras.

Este aumento, da ordem de 150%, potencializará uma maior densificação do uso do solo, ou seja, o solo urbano será ocupado de forma mais intensa e com maiores taxas de impermeabilização.

A taxa de impermeabilização é um coeficiente que auxilia o planejamento e a gestão da política urbana em cidades. Esta taxa reflete a proporção da área impermeabilizada dentro de cada lote, sendo que a mesma poderá ser fixada para todas as dimensões de lotes que se encontram dentro do perímetro urbano. Porém, para uma maior eficácia no controle de impactos, esta taxa poderá ser flexível para determinadas áreas da cidade, devido, sobretudo, às suas características topográficas e físicas.

Porém, não foram divulgadas as novas taxas limítrofes para a impermeabilização desta “nova” dimensão de lote. Caso a taxa de impermeabilização mantenha-se a mesma, os impactos serão ainda mais expressivos no Meio Ambiente urbano.

Deste modo, é possível citar o aumento expressivo do escoamento superficial das águas, comprovados pelo excesso de impermeabilização dos lotes e aumento do índice pluviométrico nas áreas com uso do solo mais intensificado, refletindo, pois, em um potencial aumento do risco de alagamentos e inundações, devido à baixíssima eficiência do sistema de drenagem urbana da cidade.

As inundações e alagamentos ficarão mais freqüentes na paisagem barreirense caso não sejam tomadas as devidas providências. Com a ocorrência destes fenômenos há expressivas perdas econômicas aos atingidos, bem como a exposição dos mesmos a doenças de veiculação hídrica, como por exemplo, leptospirose, amebíase, diarréias, giardíase, hepatite, entre outras.

No que diz respeito à dinâmica socioespacial, as mudanças provocadas após a implantação das propostas induzirá uma maior fragmentação da ocupação quanto às estruturas de classes, causada pela valorização diferencial dessas novas frações do espaço urbano. Desta forma, como diria o proeminente geógrafo Milton Santos, os interesses relativos ao estabelecimento de uma cidade econômica prevalecerão sobre as demandas pela constituição de uma cidade social.

Por outro lado, o aumento da dimensão vertical das edificações, longe de debelar o problema do déficit habitacional, tratará de ampliá-lo, já que esta proposta atenderá aos agentes que atuam no mercado de imóveis, mas não às parcelas populacionais que realmente precisam de moradia.

Este processo de verticalização ampliará a possibilidade de ganhos de setores da economia urbana, principalmente para aqueles que lidam diretamente com o ato usurário de especular, pela óbvia situação de poderem construir mais unidades em um único terreno. Porém, as expectativas geradas por este mercado que se amplia com as novas determinações do legislativo municipal são totalmente infundadas para uma parcela grande da população barreirense, que não poderá adquirir moradia aos preços que se costumam cobrar por tais habitações.

Para finalizar, cabem duas questões imperativas em relação ao processo em marcha e que são direcionadas aos edis barreirenses:

  • Não sabem os partícipes da Comissão que no Estatuto das Cidades afirma-se, no seu Capítulo IV, a necessidade de se promover a Gestão Democrática da Cidade através da promoção de audiências e debates com a população e as entidades representativas dos interesses da sociedade?
  • Convocar representantes do setor imobiliário e da construção civil, além dos técnicos da prefeitura e do CREA, é suficiente para discutir e definir alterações no Plano Diretor que afetarão uma população inteira, ou estamos diante daquela velha máxima segundo a qual a raposa guarnece o galinheiro?

Por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf