quarta-feira, 27 de abril de 2011

"Ficha Limpa: Mais uma prova da tirania no Brasil", por Marciel Viana

Uma questão polêmica surgiu na sociedade brasileira nas eleições presidenciais de 2010. Nasceu mais um filho prematuro de nossa sociedade, este se chama FICHA LIMPA. Chamo de prematuro, pois não se desenvolveu o suficiente para que se tornasse válido. Pois numa tentativa de aborto por nossos ilustres “representantes”, - que se dizem democráticos -, nosso filho quase morre. Mas que democracia é essa existente no Brasil? Não seria esta um regime de governo em que o poder de tomar importantes decisões políticas está com os cidadãos, direta ou indiretamente? Que representantes são esses que não aceitam uma decisão do povo – será porque essa decisão iria contra seus princípios tiranos? Essa forma tirana de governar é uma alternativa à democracia! Mesmo sem perder de vista que deveria representar a vontade do povo, nela o chefe governava com poder ilimitado.

Esse nosso filho deve ser tratado com muita atenção; por ser um filho com necessidades especiais e também por ser um dos únicos que ainda existe em nossa sociedade – se não o único. Nossos “representantes” rasgaram a constituição brasileira a qual diz que “o poder emana do povo”, mas a realidade é contrária. O que vemos, é o povo contra a tirania que reina no congresso e usufrui de seus milhões, enquanto que o povo fica com os seus grilhões.

Qual será então o problema do Brasil? Seria a ignorância do dito “povão”, que devido à falta de educação de qualidade não luta por seus direitos? Ou dos ditos intelectuais, que vão para mídia dizer que um dos atos mais importantes de 2010 foi a FICHA LIMPA? - Não seria esta a maior prova de que não existe democracia no Brasil? Existe então um paradoxo entre ações momentâneas e a continuação dessas ações em nossa sociedade. Seria essa não continuação, pelo fato de que o “povão” sem refletir - só faz inalar toda essa podridão que a TV nos emite? Ou dos “intelectuais” que só fazem falar e escrever e voltar para o pedestal da universidade como se não fizesse parte do “povão” e por isso mesmo não participa de uma militância social em defesa de nosso país? Não devemos nos curvar diante dessa tirania, e sim permanecer firme na luta para que nossos filhos cresçam e faça do Brasil um Estado realmente democrático.

Acaba de deixar a presidência o primeiro presidente que surge da classe trabalhadora e agora assume a primeira mulher que pretende seguir a mesma linha do governo passado. Será que teremos que esperar a primeira negra ou o primeiro negro? E outras "primeiras" e "primeiros" que surgirão, para que finalmente possamos ter um governo realmente democrático, que faça uma mudança radical nesse sistema para acabar com essa desigualdade gritante existente em nosso país?

Para que nosso país chegue realmente à democracia, devemos acabar de vez com nossa passividade e fazer as coisas acontecerem no Brasil, evitando acontecimentos vergonhosos, a exemplo do que ocorreu em agosto de 2010, quando o Ministro da Justiça Eros Grau se aposentou deixando uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal), atrapalhando o julgamento da lei da FICHA LIMPA. Que pelo fato de ter apenas 10 Ministros, o resultado – coincidentemente ficou empatado em 5 a 5 (não aprovando a lei). Eros Grau não quis se complicar e pulou logo fora do barco, já o Presidente do STF, Cezar Peluso, não quis dar seu voto de minerva, pois sabia que iria se complicar (só lembrando que ele votou contra a aprovação da FICHA LIMPA). Não seria este acontecimento algo planejado devido à proximidade das eleições em outubro de 2010? Para que não ocorresse nenhuma mudança que venha a fragilizar o modelo tirano que reina no congresso nacional?

Reporto-me a um velho e bom ditado que diz, “a esperança é a ultima que morre”, fico feliz porque ela ainda existe, e ao mesmo tempo vergonhoso por saber que é necessária tela. Neste caso, a esperança seria a entrada do novo Ministro, Luiz Fux, que poderia desempatar todo esse “jogo”. O Ministro Fux, antes de votar, elogiou a FICHA LIMPA dizendo que a mesma “conspira a favor da moralidade”, mas infelizmente os discursos divergem dos atos, e o voto do Ministro resultou na aplicabilidade da lei somente em 2012. O magistrado alega que a lei viola o princípio da anualidade eleitoral, baseando-se no artigo 16 da Constituição Federal.

Infelizmente quando se trata de beneficiar o povo, não se pode violar a lei, mas algumas exceções são salvas, do tipo: O artigo 1º, parágrafo único da Constituição Federal, citado anteriormente, diz, “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (Constituição Federal, 1988). Neste caso, a lei pode ser, e foi violada, pois se trata de beneficiar um punhado de corruptos como Cássio Cunha e Jader Barbalho que irão usufruir seus milhões – que na verdade deveriam ser do povo, mas que nos são expropriados.

Espero não precisar mais de esperança para que a FICHA LIMPA seja validada em 2012, mas existem milhares de "esperanças" para acabar no decorrer da vida. Espero um dia acabar com a principal esperança, que é ver o país seguindo de acordo com a vontade do povo, que ao invés de aplicar uma democracia representativa, aplique uma democracia direta e participativa. Essa participação direta é feita através de plebiscito popular, como foi o caso do plebiscito das armas, e não como a FICHA LIMPA, que não passou de um abaixo-assinado do povo, - pois é somente desejo deste -, e por isso mesmo não foi levado para um plebiscito popular; se fosse, seria aprovado para o ano de 2010, retirando vários corruptos do Congresso Nacional, e o Brasil entraria desde já em uma fase de transição da Tirania para a Democracia, favorecendo somente ao povo, que desde a conquista de nosso país em 1500, nunca teve esse direito.

“Devemos votar em representantes que lutem por direitos e não por privilégios”.


por Marciel Viana
Estudante de Geografia – UFBA/ICADS
Programa de Educação Tutorial – PET

5 comentários:

  1. Parafraseando Sergio Buarque de Holanda: "A Democracia no Brasil foi sempre um lamentável mal-entendido". Esta, desde que o Brasil é Brasil se viu subjugada aos interesses particulares de uma pequena (mais pujante) aristocracia rural, a qual ainda permanece firme e forte nos dias atuais. Como disse certa vez José Saramago, "vivemos numa democracia sequestrada, condicionada e amputada". Nesse cenário, o papel do Estado é descaracterizado, não exercendo mais a mesma força que outrora. O que se vê hoje, é uma política “das empresas”, que apoiadas pela mídia, controla os Estados. Usando de uma simples ilustração, podemos comparar ao Brasil a uma grande “voçoroca” (definição: “rasgão” ou “buraco” no solo, provocado pela erosão acelerada condicionada pela ação antrópica não planejada (muita das vezes), e quando não contido o processo na sua gênese, pode até descaracterizar o solo e provocar a improdutividade). Na minha opinião, o que temos no Brasil hoje é uma democracia DEGRADADA, e o meio de mitigar esse processo erosivo é ir direto a raiz do problema.... A POLÍICA. Não a política em si, mas a política atual, sustentada na "Democracia de Mercado", como chamou Milton Santos. Vejo o “Projeto da Ficha Limpa” como um iniciativa a fim de retomarmos a uma REAL DEMOCRACIA (se é que já tivemos ). Concordando com o colega (Marciel), acho que os ditos “intelectuais” devem materializar seus discursos fora dos muros da universidade, o que é pra mim é o mais difícil, diante a doença atual que nos persegue.... o COMODISMO.

    Joildes Brasil
    Estudante de Geografia (UFBA-Icads)

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  2. Olá Marciel, alguns comentários.

    Você cita o artigo 1o de nossa Constituição para defender a aplicação da lei da Ficha Limpa; porém, a mesma Constituição apresenta o seguinte Artigo:

    "Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência."

    Isto significa que você está utilizando a constituição para defender um ato inconstitucional! É claro que a inconstitucionalidade da lei é discutível (e esta foi parte da discussão no Supremo), mas o que quero dizer é que, independentemente do juízo de valor que tenho sobre a lei, em minha opinião ela altera um dos fundamentos do processo eleitoral, e a Constituição é clara neste ponto: isto só pode valer para as próximas eleições. Em outras palavras, a medida que você sugere para combater a "tirania" é um ato de rasgar a Constituição Federal: um ato de "tirania" (de acordo com sua terminologia).

    Não sou contra a lei, pelo contrário, mas é importante se manter a constitucionalidade dos atos porque, da mesma forma que esta lei é "boa", podemos nos tornar vítimas de leis arbitrárias, "más", se não tomarmos o devido cuidado. Tendemos a aceitar a adoção de medidas autoritárias quando estas nos favorecem, e isso é bem perigoso.

    Mais importante, neste momento, do que esta discussão, é criar mecanismos para que a Lei da Ficha Limpa esteja valendo no próximo pleito. Grupos como a OAB devem solicitar ao Supremo, ainda neste ano, que se pronuncie a respeito da constitucionalidade da Lei como um todo, tendo em vista que outros Ministros do Supremo, ao declararem seus votos, citaram outras possíveis irregularidades na Lei (por exemplo, sua retroatividade - um possível problema, mas que, a longo prazo, se dissolve - e a não-presunção de inocência - tema complicado mas que, também em minha opinião e ainda sem ter analisado muitos argumentos, parece não torná-la inconstitucional, pois não se está "condenando" criminalmente ninguém). É importante que o Supremo se manifeste ainda este ano; caso contrário, teremos, nas eleições de 2012 uma enxurrada de processos e liminares questionando a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa.

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  3. Olá Prof. Márcio, só pra complementar.

    No meu texto, citei o Art. 1º da constituição para “defender” a criação da lei. Logo abaixo, coloco a posição do Ministro que citou o art. 16 para acusar a sua inconstitucionalidade da lei. Posso até está sendo extremista, mas a meu ver, essas complicações existentes juntamente com o empate na primeira votação, se encaixam tão bem, que deixa a entender - em minha opinião -, que existe certa estratégia com relação à aplicação dessa lei.
    Olhando somente o art. 16 da constituição, a lei realmente é inconstitucional, e se validasse para as eleições passadas, poderia ter sido uma ação autoritária e o governo poderia utilizar a Ficha Limpa como exemplo para aplicação de outras leis, também de forma autoritária. Porém, quando se trata de beneficiar a sociedade, devem existir algumas ressalvas, ou seja, “a lei só pode ser aplicada um ano após a sua aprovação, salvo, quando a mesma for solicitada pela sociedade civil organizada”. Dessa maneira, a lei poderia ter sido aprovada e aplicada de forma constitucional.
    Posso está sonhando com um artigo desses na constituição, mas como dizia Raul Seixas, “sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade”.
    Espero que a OAB, que já está entrando com um processo de constitucionalidade da lei da Ficha Limpa, seja ouvida e a lei seja aplicada para as eleições de 2012, senão, o termo “tirania” será realmente o melhor para caracterizar a situação política do Brasil.

    Marciel Viana

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  4. “A liberdade de eleições permite que você escolha o molho com o qual será devorado.”
    — Eduardo Galeano


    “Os políticos e as fraldas devem ser mudados frequentemente e pela mesma razão.”
    — Eça de Queirós

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  5. O problema dos políticos é que eles relutam em aceitar o óbvio: como colocar um ladrão para administrar um banco? Como colocar um pedófilo para trabalhar numa creche? Como colocar alguém que responde a processos administrativos, de uso indevido do dinheiro público (pra não falar favorecimento de empresas e possíveis propinas), de desvio de verba pública (pra não falar roubo) para administrar o dinheiro dos contribuintes? Bom, a graaande maioria está no mesmo barco. Acredito no Humberto Gessinger quando ele diz "é melhor começar tudo de novo do que acabar pela primeira vez". Ainda tá em tempo de tomar os prédios de Brasília, bem como as prefeituras e câmaras de todas as cidades, e transformá-los em casas; tomar seus jardins e transformá-los em roças.

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