sexta-feira, 3 de setembro de 2010

"O Público e o Privado em Barreiras", por Márcio Carvalho

Vou descrever brevemente uma saga pessoal em Barreiras, mas que certamente vários leitores deste blog já enfrentaram; depois, uma análise política sobre o caso.

Quando cheguei em Barreiras, já há quase dois anos, uma das minhas primeiras providências foi procurar por uma conexão de internet. A monopolística OI não tinha (e não tem até hoje) nenhuma linha Velox disponível. Amigos me indicaram alguns "particulares" que teriam linhas: rejeitei, por achar um absurdo "contrabandear" uma conexão. Finalmente, assinei um serviço 3G da Vivo, que afirma disponibilizar uma banda de 1MB, mas, na real, funciona a maior parte do tempo como uma conexão discada (56kbps), quando não cai... Esta maravilha do mundo moderno pela bagatela de R$119 mensais!

Pois bem, depois de mais de um ano e meio, desisti da "Morto" (Vivo), de receber um serviço (ao menos) decente, de meus princípios, enfim. Liguei para um "particular" que, supostamente, poderia me ajudar. Ele tem dois "planos de assinatura":

1) Ele mesmo tem uma conexão (comercial, deve ter sido obtida há algum tempo) de 8MB e compartilha, por R$50 mensais, uma banda de 500kbps, por rádio; ou
2) O "particular" tem linhas da Velox/OI para "vender" por R$1.000; neste caso, ele transfere a linha para mim, e eu vou pagar os mesmos R$120 mensais para a OI (por um serviço sem dúvida melhor do que meu atual, mas ainda assim ruim).

E aqui terminam minhas lamúrias e começa a análise política.

Esta situação é herdeira de uma questão histórica no Estado brasileiro: a confusão entre "público" e "privado". Em nosso país, desde cedo, o poder público sempre dividiu seu poder com "particulares", usualmente detentores do poder econômico. Quando nos tornamos um Império, a população ia pedir favores à aristocracia, à realeza, detentora do poder político (e, portanto, público), mas sempre numa relação pessoal.

Ao nos tornarmos República, os altos postos do governo sempre foram ocupados por membros da elite econômica. Isto significou a transposição de um modo pessoal de funcionamento para dentro da burocracia brasileira; por exemplo, os "coronéis" ou usineiros, que exerciam um poder paralelo ao do Estado formal se tornam, eles mesmos ou seus parentes, parte da máquina do Estado e ocupantes de cargos eletivos.

Aqui voltamos ao meu caso com a internet. A Telemar/OI é um quase-monopólio privado resultante da privatização (doação) atabalhoada do antigo monopólio público, na era FHC. Nosso "particular" descrito acima certamente tem relações com antigos funcionários da Tele (ou talvez fosse, ele próprio, um funcionário ou um terceirizado) e, quando da oferta inicial de linhas de internet na cidade, usou desta relação para adquirir várias linhas e, inclusive, um link que nem a UFBA hoje tem disponível. O público, invadido pelo privado, retroage sobre o privado/privatizado: privatiza-se o lucro, mas muito dos custos e as relações continuam iguais, uns coletivizados, os outros "particulares".

Outra - e mais grave - instância da mistura público/privado em Barreiras é o funcionamento da Prefeitura Municipal. Chega-se lá e o que se vê é um amontoado de pessoas ("particulares") indo pedir favores (empregos, em geral); essas pessoas ficam numa sala de espera, e a assessoria da Prefeitura funciona como "ACESSO-ria": escolhe que vai ter acesso à Prefeita.

A Prefeitura, assim, funciona como um balcão onde a "pessoa" da Prefeita vai ouvir os pedidos dos "particulares", em uma relação privada. A Prefeitura, ao contrário, deveria funcionar como um órgão público, o Estado neste Município: uma instância sempre pronta, sim, a ouvir e receber demandas coletivas e atendê-las enquanto instituição, não de maneira pessoal.

Como mudar isso? Esta situação já tem melhorado em outro lugares do país. Mas isso exige controle e pressão populares, conscientização - uma vez que também deve partir da população o abandono de práticas personalistas como estas - e voto. Voto naqueles dispostos a resolver questões da coletividade, e não dados a promessas de caráter individual. Voto naqueles que conseguem agir como pessoas públicas e tratar o Estado como uma instituição de atendimento de interesses públicos - e não particulares.

Vote bem, vote em quem tem propostas para o Município e a região, e não apenas naquele que pode, um dia, te dar um emprego ou outro benefício. (Em tempo: não estou, com este texto, apoiando nenhum candidato, mas, apenas, uma discussão política mais qualificada, que fuja aos lugares-comuns da corrupção, do empreguismo e do personalismo).

Por Márcio Carvalho

domingo, 22 de agosto de 2010

"Natureza e Civilização", por Márcio Lima

Meu último texto gerou algumas conversas interessantes. Como elas não foram registradas por escrito, reproduzo-as agora laconicamente. Ouvi, em primeiro lugar, comentários segundo os quais o blog finalmente abriu espaço para as “coisas boas” do Oeste; a seguir, alguns professores, que têm também já o hábito de ciceronear outros professores que aqui vêm participar de bancas, me fizeram relatos sobre outras impressões muito afins àquelas dos professores do concurso da banca de francês que relatei, ou seja, alguns lugares na cidade (bares e restaurantes) se revelam aprazíveis, mas sobretudo a natureza exuberante provoca um “encantamento”.

Quero, porém, demorar-me mais na primeira questão, naquela sobre as “coisas boas do Oeste”. A concepção deste blog tem a ver com um desejo de criar um espaço de reflexão sobre o lugar onde moramos. A vontade inicial, ainda que de modo muito seminal, era a de criar um jornal impresso. Devido à dificuldade de tal ambição, e dada a urgência da reflexão, resolvemos um tanto espontaneamente criar um blog. O primeiro passo foi dar um nome. Por sugestão de Márcio Carvalho, decidimos por oestemaquia. Apesar de nunca termos discutido todas as possibilidades paras as quais o nome aponta, o certo é que pelo menos três sentidos lhe podem ser atribuídos. Em primeiro lugar, há uma paráfrase amistosa a um famoso endereço virtual da região. Para aquele que, por exemplo, tenta ter acesso ao “Oestemaquia” por meio do Google, este site questionará se o pesquisador não quis dizer “Oestemania”. Estamos, assim, à sombra do site que nos inspirou. Há também o segundo sentido, que recai sobre o verbo maquiar, que é o ato de mascarar algo, de tentar dar a algo ruim um aspecto melhor. Sem dúvida que esse é o sentido mais forte, pois expressa bem a direção deste espaço, que é a tentativa de desmistificar ou tentar discutir certas questões para além da sua aparição a princípio mais evidente.

Há, ainda, um terceiro sentido a que ainda podemos apelar. Em grego, maquia significa guerra. Titanomaquia, por exemplo, significa guerra de Titãs, e no contexto mítico refere-se à luta que deu a Zeus a vitória sobre seus oponentes, assegurando-lhe a instalação da justiça e do legado mitológico tal como o conhecemos. Como sempre acontece, antecipando reflexões posteriores, a passagem do caos primordial ao reino da justiça divina conquistada por Zeus, a narrativa mítica nos faz refletir sobre aquela passagem de que fala os filósofos modernos, chamados contratualistas, do estado de natureza para o estado governado por leis, onde a política substitui a força. Rousseau, por exemplo, considera o estabelecimento da propriedade privada como o ato fundador da sociedade: “o primeiro homem que cercou um terreno e disse é isto é meu, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil”, afirma o filósofo. Tudo isso para lembrar que a questão da propriedade privada, por estas bandas, parece testemunhar muito mais uma sociedade regida pelas forças físicas do que pelas leis propriamente. Voltando a um ponto que mencionei há algum tempo, basta alguém procurar por escrituras para saber do que falo. Não seria de todo descabido invocar o terceiro sentido da palavra maquia para expressar a falta de fundamentos basilares que regem as sociedades. Se nem a questão da propriedade privada foi resolvida no Oeste baiano, isso significa que o Contrato Social ainda não está em pleno vigor. Ainda vivemos, de alguma força, sob a pressão da força que caracteriza a guerra de todos contra todos, situação limite descrita por outro filósofo contratualista: Hobbes.

Mas volto à questão que motivou essa longa digressão. Não é por falta de atrativos que este espaço se concentra em apontar para o que há de ruim na região. Isso acontece simplesmente por que nosso objetivo é refletir sobre problemas. E desde logo isso me impele a transformar as ditas "coisas boas" em matéria que merece outra abordagem. Isso significa dizer que, infelizmente, as belezas naturais da região parecem mais reforçar do que contradizer as mazelas sociais e políticas. Não é verdade que aos domingos as pessoas vão ao Rio de Ondas lavar a alma maculada na semana pela poluição auditiva, visual e, sobretudo, olfativa? Pondo na balança, a água podre do esgoto a céu aberto parece valer menos do que a água cristalina do Rio, ou seja, o Rio de Ondas parece compensar o fato de não haver saneamento básico, de modo que ficamos todos em paz. Essa comparação me leva a pensar que, em Barreiras, a natureza parece estar sendo um entrave à civilização. Explico-me.

Se morássemos num lugar sem grutas, cavernas, cachoeiras e rios em abundância, talvez a população não aceitasse com tanta paciência os problemas que grassam dentro da cidade. Quando, em 2006, fui aprovado no concurso, e já à espera de vir para Barreiras – prestei concurso em Salvador –, fui à internet buscar informações sobre a cidade para onde me mudaria. Como hoje, a melhor página de informações que encontrei foi a da prefeitura. Claro que eu já tinha notícias daquilo que muitos sabem fora da região, que Barreiras é uma cidade do interior desenvolvida, desenvolvimento propiciado graças à soja e ao agronegócio. – A soja continua exercendo o papel publicitário, o elo entre a cidade e agricultura. Mas, afora essa informação geral, acabei descobrindo na internet outros atrativos da região, quase todos ligados à exuberância natural, além do arsenal pré-histórico que me chamou a atenção. Ora, para alguém que cresceu no semi-árido, acostumado a rios temporários, viver numa cidade cortada por dois rios exercia um fascínio nada desprezível.

No entanto, as primeiras impressões em nada confirmam as expectativas. Primeiro, porque a parte urbana de Barreiras é feia, as ruas assustam, os imóveis nem de longe fazem jus aos preços praticados. Culturalmente, a vida da cidade é paupérrima. Aliás, falar em vida cultural é muita bondade. No fim das contas, a natureza em nada estende seus tentáculos à parte urbana. Há, ao contrário, uma cisão muito grande entre um espaço e outro. Aos poucos, as belezas daquela servem para nos fazer escapar à feiúra desta. Mesmo os dois rios não conseguem impor sua beleza quando atravessam a cidade, pois lhes falta trabalho paisagístico. Ao contrário, a beleza natural erode dentro da cidade. Quem já viu pessoas fazendo poses no cais do Rio Grande para tirar fotos, de modo a integrar no retrato cidade e rio? Se isso ocorre, é apenas por motivos prosaicos, não como lembrança de uma paisagem que se deva guardar. Um exemplo dessa contradição entre natureza e civilização pode ser verificado também nas entradas de Barreiras.

Quem, com efeito, atravessa a cidade pela famigerada BR 242 percebe uma mudança radical do entorno quando paulatinamente vai entrando na área urbana. Vindo de Salvador, logo a visão deixa de ver as serras e a paisagem do cerrado para notar, de um lado e do outro da rodovia, as ruas sujas, com a terra vermelha dando mostras de que a urbanização passa longe. Do mesmo modo, quem vem de Brasília logo se despede do cerrado e depara com um trecho urbano cuja imagem modelar é a do entorno da rodoviária. Em geral, o espaço que se desenvolve ao redor de rodovias não costuma ser o símbolo da urbanidade. No entanto, ao contrário do que é comum, a BR 242 define o traçado principal da cidade. Em torno dela, a cidade se desenvolveu: a prefeitura está nela. A Câmara de Vereadores está nela. A universidade mais antiga também. Quase todas as referências urbanas de importância estão a menos de um quilômetro dela. Ela é nossa Avenida Paulista.

Uma questão crucial nessa relação tensa entre natureza e civilização é saber por que, estando localizada numa região tão privilegiada em termos naturais, e não sendo nem de longe uma cidade miserável em termos econômicos, Barreiras é o que é. Daí entendemos por que, não estando em harmonia o aspecto urbano com a natural, este acabe servindo de escape para “sublimar” o caos da cidade. Mas antes de nos entregamos ao idílio romântico de volta à natureza, ainda cabem mais algumas reflexões.

Por Márcio Lima

sexta-feira, 30 de julho de 2010

"Impressões Alheias", por Márcio Lima

Desde o início de junho, a UFBA passa por mais uma temporada de concursos. Logo Barreiras receberá uma nova safra de aproximadamente vinte docentes. Na última semana, tivemos, dentre outras bancas, uma destinada à Língua Francesa. Montar banca de concursos é uma verdadeira epopeia. A primeira dificuldade é encontrar professores que aceitam compor a banca, e por diversas razões. A seguir, vêm as negociações em torno de uma data comum. Finalmente, correr contra o tempo para comprar passagens de avião. Todas essas questões não raro interferem no planejamento das atividades da Universidade. Como estamos em ano eleitoral, nomeações de concurso público só podiam ser feitas até o final de junho. E, para tanto, só podiam ser nomeados os aprovados em concursos realizados até a segunda semana daquele mês. Dada a urgência de um (a) professor (a) de francês, o concurso deveria ter sido realizado na primeira semana. Como isso não foi possível, a seleção só pôde ser realizada na semana passada. Resultado final: os alunos ficarão um semestre sem aulas de francês.

Compuseram a comissão avaliadora a professora Denise Lavallé da UNEB, Marcel Lavallé, canadense e professor aposentado da Université du Québec à Montréal, além de Dominique Boxus, belga radicado no Brasil e que leciona na Universidade Federal de Sergipe. Quando fiz contato com a professora Denise, a primeira resposta dela foi a tradução mais genuína de sua pessoa, ou seja, da pura simpatia. Mas, além de sinalizar positivamente, ela escreveu-me contando que seu marido havia gostado muito da ideia, sobretudo porque queria conhecer alguns sítios arqueológicos da região. Infelizmente, por conta do aperto das datas, não conseguimos articular um período que permitisse fazer o passeio. Acertamos que todo o processo seletivo seria feito num tempo corrido. Até a realização de fato do concurso, a vinda deles teria como único motivo a seleção pública.

Contudo, se o cronograma parecia não abrir espaço para o passeio, a realidade revelou-se outra. Encontramos, assim, uma manhã para irmos a São Desidério atender ao desejo do professor Marcel. Embora sem a possibilidade do olhar paciente como exige os lugares visitados, tivemos a oportunidade de ver uma pequena série de pinturas rupestres, bem como visitar o Parque Municipal de São Desidério, onde está a sublime Lagoa Azul e a gruta do Catão, clássica no nome, mas barroca nas formas. Desnecessário dizer que todos apreciaram muitíssimo o passeio, muito bem ciceroneado por Juci, guia e proprietário da Rupestre Turismo e, quiçá, futuro estudante do curso de história da UFBA. Espero tê-lo convencido disso. É sempre instigante ver pessoas movidas por um pathos ao conhecimento, integrado plenamente àquilo a que se dedica, sobretudo quando vemos a universidade muitas vezes tomada por um pragmatismo chão que se expressa pela busca tresloucada pelo “diploma”.

No mesmo dia da visita a São Desidério, convidei-os para jantar. Os professores Marcel e Denise, porém, declinaram do convite. Queriam descansar para a viagem do dia seguinte após uma longa jornada de trabalho associada ao passeio, que, sem dúvida, exigiu muito mais esforço físico do que a avaliação do concurso. Por isso, levei apenas Dominique para conhecer a noite barreirense. Primeiro experimentamos o Dom Quixope, cuja altura da música, que impedia qualquer possibilidade de conversa, nos obrigou a “bater em retirada”. Fomos ao Trapiche. Por ser uma quinta, a tranquilidade do lugar nesse dia nos permitiu, enfim, conversar bastante. Numa situação como essa, é inevitável falar da história de Barreiras. E, quando lá fechou, esticamos ainda um pouco no Lavoisier. No dia seguinte, Dominique contava aos outros dois professores suas peripécias, elogiando bastante os bares por que passou. Esses seus comentários foram apenas uma variação do que ele me dissera e o que me motivou a escrever este e outros textos porvir: “vou levar daqui uma impressão muito boa”.

Volto ainda a essas questões.

Por Márcio Lima

segunda-feira, 12 de julho de 2010

"O Que Significam as Atuais Alterações no Plano Diretor de Barreiras? Parte III", por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

Como forma de promover a minimização dos impactos relatados no post anterior, há que se potencializar a criação de áreas verdes intraurbanas como, por exemplo, parques e jardins, além de ações pautadas em um eficiente programa de arborização urbana, com fins ao aumento do conforto térmico e uma melhoria na ambiência urbana. Na Figura 3 observa-se os benefícios da arborização em ambientes urbanos quanto à temperatura.
Figura 3. Benefícios da arborização urbana.

Desta forma, a temperatura da superfície para áreas de concreto e asfalto está em torno de 47º C e 50º C, respectivamente, sendo que para áreas com sombreamento há uma redução expressiva do calor.

Com relação a outra proposta de alteração do PDU de Barreiras (redução de áreas mínimas de lotes) há algumas considerações a serem feitas. Primeiramente, observa-se por meio da Figura 4 o parcelamento do solo do atual PDU, bem como sua proposta de alteração.

Conforme já fora mencionado, a proposta apresentada na Câmara de Vereadores é para que seja reduzida a área mínima dos lotes na cidade Barreiras, dos atuais 360 m² para 125 m².


Figura 4. Formas de parcelamento do solo (atual e proposta).

Hipoteticamente, um conjunto de 12 lotes com dimensões de 12 x 30m (360 m²) foi dividido segundo as sugestões propostas de Câmara dos Vereadores. Nota-se que para a mesma área o número de lotes passou de 12 para 30 lotes com dimensões de 6 x 20,84m (125,04 m²). Com esta nova configuração de dimensões de lotes haverá ainda a modificação dos padrões das quadras, pois não haverá espaços vazios (não ocupados) dentro das quadras. Assim, a modificação poderá ser quanto ao tamanho dos lotes, bem como do dimensionamento das quadras.

Este aumento, da ordem de 150%, potencializará uma maior densificação do uso do solo, ou seja, o solo urbano será ocupado de forma mais intensa e com maiores taxas de impermeabilização.

A taxa de impermeabilização é um coeficiente que auxilia o planejamento e a gestão da política urbana em cidades. Esta taxa reflete a proporção da área impermeabilizada dentro de cada lote, sendo que a mesma poderá ser fixada para todas as dimensões de lotes que se encontram dentro do perímetro urbano. Porém, para uma maior eficácia no controle de impactos, esta taxa poderá ser flexível para determinadas áreas da cidade, devido, sobretudo, às suas características topográficas e físicas.

Porém, não foram divulgadas as novas taxas limítrofes para a impermeabilização desta “nova” dimensão de lote. Caso a taxa de impermeabilização mantenha-se a mesma, os impactos serão ainda mais expressivos no Meio Ambiente urbano.

Deste modo, é possível citar o aumento expressivo do escoamento superficial das águas, comprovados pelo excesso de impermeabilização dos lotes e aumento do índice pluviométrico nas áreas com uso do solo mais intensificado, refletindo, pois, em um potencial aumento do risco de alagamentos e inundações, devido à baixíssima eficiência do sistema de drenagem urbana da cidade.

As inundações e alagamentos ficarão mais freqüentes na paisagem barreirense caso não sejam tomadas as devidas providências. Com a ocorrência destes fenômenos há expressivas perdas econômicas aos atingidos, bem como a exposição dos mesmos a doenças de veiculação hídrica, como por exemplo, leptospirose, amebíase, diarréias, giardíase, hepatite, entre outras.

No que diz respeito à dinâmica socioespacial, as mudanças provocadas após a implantação das propostas induzirá uma maior fragmentação da ocupação quanto às estruturas de classes, causada pela valorização diferencial dessas novas frações do espaço urbano. Desta forma, como diria o proeminente geógrafo Milton Santos, os interesses relativos ao estabelecimento de uma cidade econômica prevalecerão sobre as demandas pela constituição de uma cidade social.

Por outro lado, o aumento da dimensão vertical das edificações, longe de debelar o problema do déficit habitacional, tratará de ampliá-lo, já que esta proposta atenderá aos agentes que atuam no mercado de imóveis, mas não às parcelas populacionais que realmente precisam de moradia.

Este processo de verticalização ampliará a possibilidade de ganhos de setores da economia urbana, principalmente para aqueles que lidam diretamente com o ato usurário de especular, pela óbvia situação de poderem construir mais unidades em um único terreno. Porém, as expectativas geradas por este mercado que se amplia com as novas determinações do legislativo municipal são totalmente infundadas para uma parcela grande da população barreirense, que não poderá adquirir moradia aos preços que se costumam cobrar por tais habitações.

Para finalizar, cabem duas questões imperativas em relação ao processo em marcha e que são direcionadas aos edis barreirenses:

  • Não sabem os partícipes da Comissão que no Estatuto das Cidades afirma-se, no seu Capítulo IV, a necessidade de se promover a Gestão Democrática da Cidade através da promoção de audiências e debates com a população e as entidades representativas dos interesses da sociedade?
  • Convocar representantes do setor imobiliário e da construção civil, além dos técnicos da prefeitura e do CREA, é suficiente para discutir e definir alterações no Plano Diretor que afetarão uma população inteira, ou estamos diante daquela velha máxima segundo a qual a raposa guarnece o galinheiro?

Por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

terça-feira, 29 de junho de 2010

"O Que Significam as Atuais Alterações no Plano Diretor de Barreiras? Parte II", por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

No post anterior, buscamos contextualizar algumas das transformações pelas quais Barreiras passou nas últimas décadas, a sua importância em uma escala urbano-regional e a implantação do Plano Diretor Urbano, o instrumento máximo que visa garantir o desenvolvimento urbano autêntico na cidade.

Eis que, contrariando os princípios anteriormente relatados e aos grandes teóricos dos estudos sobre as cidades, a Câmara de Vereadores de Barreiras, através da Comissão de Planejamento, Trânsito e Obras, propõe duas mudanças no Plano Diretor do município visando (a) alterar o modelo vigente de parcelamento do solo e (b) a altura máxima das edificações, que passa dos atuais sete para trinta (!) andares.

O primeiro aspecto a ser questionado sobre as mudanças propostas diz respeito às discussões que antecederam à própria decisão de alterar o Plano barreirense. No sítio web da Câmara de Vereadores há uma nota publicada no dia 30 de março de 2010, com o título PDU de Barreiras sofrerá mudanças, na qual se informa o seguinte: “A Comissão de Planejamento da Câmara se reuniu com os representantes do setor imobiliário, construção civil, técnicos da prefeitura e do CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) para discutir o PDU de Barreiras”.

A proposta, como divulgado pelo sítio web da Câmara de Vereadores, diz respeito às alterações na altura máxima das edificações e no tamanho dos lotes, que será reduzido dos atuais 360 m2 para 125 m2.

A Lei de Parcelamento do Solo regulamenta como a cidade será ocupada, bem como a intensidade de sua ocupação. Com a alteração que se está propondo, importantes impactos serão sentidos no Meio Ambiente urbano, bem como na dinâmica socioespacial, com incidência direta sobre a especulação imobiliária.

Os impactos ambientais que podem ser relatados com o aumento significativo da altura máxima das edificações estão relacionados à formação de ilhas de calor, aumento da temperatura do ar, concentração de gases poluentes, baixa dispersão de aerossóis, aumento nos casos de doenças respiratórias, desconforto térmico, aumento de precipitações, dentre outros.

Pode ser visualizado por meio da Figura 1 um esquema ilustrativo de como é o atual limite das edificações (sete pavimentos), bem como do limite proposto pela alteração da Lei de Parcelamento do Solo (30 pavimentos).

Figura 1. Aumento do limite para edificações.

Adotando, em média, que para cada pavimento há uma altura aproximada de 3 (três) metros, o limite do atual PDU é de aproximadamente 21 (vinte e um) metros. Porém, a alteração propõe que este limite passe para 30 pavimentos, o que corresponderia aproximadamente a 90 (noventa) metros.

Desta forma, em Barreiras, após aprovada esta modificação, muitas das edificações que estão fora da legislação urbanística atual seriam contempladas com a legalidade, bem como poderemos ver a cada dia, mais e mais edificações com alturas exorbitantes para o padrão de ocupação de Barreiras.

Assim, com este aumento da altura das edificações a circulação na baixa atmosfera será alterada sensivelmente, pois haverá maiores impedimentos a circulação de ventos.
Desta forma, impactos associados à formação de ilhas de calor começarão a preocupar a população residente na cidade de Barreiras, visto que, haverá maiores amplitudes entre os registros das temperaturas máxima e mínima. Esta diferença de temperatura do ar ocorrerá em diferentes localidades dentro da cidade de Barreiras, ocasionando a formação de regiões mais quentes, nas áreas centrais, e mais amenas em bairros periféricos.

Com a formação de ilhas de calor, devido ao aumento do limite das edificações, haverá também uma maior dificuldade de dispersão de aerossóis e gases poluentes nestas áreas. Na Figura 2 pode-se observar um esquema ilustrativo deste comportamento.

Figura 2. Dificuldade de dispersão de aerossóis e gases poluentes.

Os aerossóis são caracterizados como partículas de poeira em suspensão, sendo grosseiramente identificados quando nota-se ao horizonte, uma coloração “meio avermelhada” no ar. Já os gases poluentes são caracterizados, em sua maioria, como sendo provenientes da queima de combustíveis fósseis, como por exemplo, gasolina, álcool e diesel. Caracterizam-se como os principais gases poluentes o dióxido de carbono (CO2), ozônio (O3) e metano (CH4), lançados na atmosfera por automóveis e indústrias, principalmente.

Esta baixa dispersão de aerossóis e gases poluentes, provocada pela altura das edificações, fará que em épocas de baixa umidade, caracterizadas pela baixa pluviosidade, ocorram mais registros de doenças das vias respiratórias (rinite, asma, bronquite, sinusite, etc.) na população barreirense, sendo os grupos de maiores incidências as crianças e idosos.

Se não bastasse o descrito anteriormente, haverá aumento no desconforto térmico e alterações expressivas nos índices pluviométricos na cidade de Barreiras. É fato que a formação de ilhas de calor, devido à intensificação do uso do solo e outros fatores potencializam o desconforto térmico a população.

Este desconforto térmico, ocasionado pela construção de “barreiras” à circulação, proporciona pouca reaeração da baixa atmosfera, aliado a gradativa redução de áreas verdes acaba, pois gerando um ciclo vicioso bastante perigoso e oneroso à população barreirense.

Por outro lado, há comprovadamente aumento nos índices pluviométricos (chuva) com a formação de ilhas de calor e aumento de aerossóis em suspensão. Esta situação gerará impactos relacionados ao aumento do risco a alagamentos, devido a baixa eficiência de drenagem urbana no município.

(CONTINUA)...
Por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

segunda-feira, 14 de junho de 2010

"Quem Vai Rogar por Nós?", por Márcio Lima

Há hoje no Brasil uma discussão sobre uma suposta politização excessiva do Poder Judiciário. Recentemente, temos assistido a muitas interferências da justiça no processo político, as quais tiveram sua máxima expressão na cassação dos mandatos dos governadores da Paraíba, Cássio Cunha Lima, do PSDB, e do Maranhão, Jackson Lago, do PDT. O Maranhão é o Maranhão. Assim, é mesmo de desconfiar quando um juiz devolve à família Sarney o poder perdido nas urnas.

É precisamente essa suposta politização do Judiciário que políticos com problemas com a lei têm invocado, antes de tudo, para se defenderem. Em geral, essa defesa é sintetizada na frase melíflua de que os políticos tanto gostam: “sou vítima de perseguição”. Não seria diferente com Jusmari. Já é a segunda vez que ela é cassada e reconduzida ao cargo de prefeita. Mas é bom lembrar que, em 2007, quando ainda era deputada, a atual chefe do executivo também esteve prestes a perder o mandato, isso por conta da lei de fidelidade partidária. Ela havia deixado o DEM para filiar-se ao seu atual partido, o PR. Como agora, a própria justiça preservou o mandato da então deputada, salva na ocasião por uma anistia geral. Como agora, sua tese principal de defesa era a perseguição.

Por que o DEM estaria perseguindo Jusmari? Ora, sem dúvida que a morte de ACM em 2007 contribuiu para erodir a coesão política que havia em torno do ex-governador e ex-todo poderoso da Bahia. No entanto, já as eleições de 2006 prenunciaram o enfraquecimento do DEM, pois muitos integrantes deixaram o partido, como foi o caso do também ex-governador César Borges, que se filiou ao PR. O partido viu, assim, muitos nomes de suas fileiras trocando de legenda. Em alguns casos, como o de Jusmari, não houve apenas troca de partido, mas mudança de alianças.

Como não poderia deixar de ser, há em Barreiras uma tentativa de fazer descer goela abaixo o discurso de que depois de dezesseis anos de poder nas mãos da família Pedrosa, há uma ruptura, que se desenvolve em harmonia com a mudança ocorrida nas esferas estaduais, com a eleição, em 2006, do Governador Jaques Wagner. A Bahia e Barreiras teriam infligido, nas últimas eleições, mudanças nos seus rumos. Se lá em cima ACM e seus prosélitos perderam o poder, aqui embaixo Saulo e Antônio Henrique foram destituídos. Jusmari, como se estivesse sempre do lado oposto ao de ACM, surge como arauto da mudança política barreirense.

Desconheço o posicionamento de Antônio Henrique quando prefeito, se era aliado ou oposição a ACM, mas tenho notícias de que Saulo sempre fora oposição, ao contrário de Jusmari, pertencente aos quadros do carlismo. Nunca é demais lembrar que seu marido, Oziel Oliveira, governou por oito anos Luís Eduardo Magalhães, acontecimento que pode ser o exemplo maior da união pretérita de uma outra família com os “antigos donos do poder”. Desconfio, portanto, do discurso segundo o qual um novo tempo tenha começado para Barreiras e para Bahia, erguido sobre as cinzas do carlismo. Aqui, essa nova época não está sendo conduzida por uma antiga aliada, amiga agora dos que estão no poder? Não é de admirar que se o DEM voltar a governar a Bahia, e o PSDB o Brasil, muitos se tornarem outra vez da base aliada dos novos governantes. Também não se sustenta o discurso de perseguição política. Até porque até o momento Jusmari se livrou das cassações. Só poderíamos falar de politização do judiciário em escala regional se o mesmo juiz, diante das mesmas infrações que o levaram a cassar a prefeita, fizesse vistas grossas ao sucessor de Jusmari.

O caso é que a “primeira prefeita” e “prefeita de primeira” está de volta, assim como o governo “cidade mãe” restabelecido. Já tive oportunidade de comentar os slogans políticos da atual administração aqui. Mas é surpreendente como esses bordões exprimem tão bem a obra do atual governo. Ora, a prefeita de primeira, tão-logo tomou posse, fez valer suas palavras. Mas, em vez de botar a cidade para frente, colocou no ponto morto. Não satisfeita, fez da marcha a ré o ritmo de seu governo. E o que parecia impossível tornou-se fato: Barreiras ficou ainda pior. O que nos faz pensar no outro slogan: que tipo de mãe é essa cidade? Só consigo lembrar-me de Medeia. Na mitologia grega, Medeia é aquela que mata os filhos para vingar-se do marido Jasão. Não sei de quem a cidade mãe quer vingar-se, embora seja evidente que seus filhos é que estão pagando a conta da vingança. E agora, quem vai rogar por nós?

Por Márcio Lima

terça-feira, 8 de junho de 2010

"O Que Significam as Atuais Alterações no Plano Diretor de Barreiras? Parte I", por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

Maior cidade do Oeste Baiano, Barreiras possui cerca de 140 mil habitantes, sendo considerada por muitos a “capital” informal do Além São Francisco. De fato, a urbe barreirense exerce considerável influência sobre as demais da região, encabeçando uma rede urbana de caráter interestadual que engloba parte da Bahia, sul do Piauí e leste do Tocantins.

Neste sentido, como apontado pelo REGIC (Regiões de Influência das Cidades), documento elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas que busca definir a hierarquia dos centros brasileiros e as suas regiões de influência, Barreiras é considerada um “centro regional” ou, dito de outra forma, uma cidade média.

Uma cidade média, de forma geral, é aquela que possui um considerável contingente populacional e que, devido à diversidade e força das suas funções urbanas, exerce centralidade frente às demais nucleações de uma região, ainda que esteja subordinada por uma urbe maior, normalmente uma metrópole.

Ora, qualquer um que tente aplicar as variáveis apresentadas ao caso de Barreiras irá constatar que todas cabem à cidade oestina. Portanto, não é nada difícil concluir que se está tratando de uma cidade importante e, por que não dizer, rica.

Ocorre que, para atingir a condição de centro regional que ostenta atualmente, um preço alto foi cobrado a esta cidade.

Se a centralidade de Barreiras no Oeste Baiano já se desenhava desde tempos idos, substituindo gradativamente a cidade de Barra no seu papel de entroncamento mercantil, foi a partir da introdução das modernas técnicas de produção agrícola na região que tal situação se fez realidade.

Assim, visando atender principalmente às necessidades geradas pelos agentes econômicos que passaram a atuar no Oeste Baiano, Barreiras consolidou a sua condição de (a) centro terciário, com a abertura de empreendimentos comerciais e de serviços, muitos deles voltados ao atendimento de demandas do campo; (b) difusor de inovações, graças principalmente à criação de instituições de ensino superior e, ao menos regionalmente, de; (c) centro de gestão do território, devido à abertura de escritórios de órgãos públicos que atuam nas esferas estadual e federal.

Todas estas transformações produziram benefícios para a cidade, cada vez mais moderna. Mas produziram também uma escalada vertiginosa de problemas que são típicos das cidades cujo crescimento populacional acelerado não é acompanhado por políticas públicas que provenham este contingente dos serviços básicos que necessitam.

Só para lembrar, a cidade de Barreiras, que na década de 1970 possuía algo em torno de 9,5 mil habitantes, teve a sua população multiplicada diversas vezes, até atingir os números atuais. Isto em um lapso de 40 anos!!

A mancha urbana se expandiu e novas moradias, empreendimentos comerciais, escritórios e instituições foram incorporados à paisagem de Barreiras, mas não sem conflitos e contradições. A fragmentação socioespacial se ampliou com o processo de periferização, a ocupação de encostas e a falta de saneamento básico resultaram em graves conseqüências para o Meio Ambiente urbano, além dos problemas referentes ao transporte público, especulação imobiliária e de gestão pública, entre outros.

Assim, o importante centro regional do Oeste Baiano, propulsor da economia de um vasto território e prenhe de funções urbanas, é também o locus de problemas dignos das grandes metrópoles brasileiras.

Para reverter tal quadro – ao menos em tese – e atendendo ao preconizado no Estatuto das Cidades, a municipalidade de Barreiras promoveu, na década de 1990 (com atualização em 2003), a elaboração do seu Plano Diretor, o documento-base que institui a política de Desenvolvimento Urbano de todos os municípios brasileiros com população igual ou superior a 20 mil habitantes.

Neste documento devem constar, entre outros temas, as políticas públicas que visem combater a especulação imobiliária, reduzir o nível de disparidade socioespacial intraurbana e democratizar o planejamento e a gestão do espaço urbano. Mais ainda: o Plano Diretor deve ser o alicerce de um projeto amplo de Reforma Urbana que promova o desenvolvimento autêntico da cidade, sem metáforas e sofismas.
(CONTINUA)...

Por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf