Lá pelas décadas finais do século XIX, um proeminente geógrafo francês, de nome Paul Vidal de La Blache, desenvolveu um discurso teórico referendado pelo conceito de “gênero de vida”. Segundo o mestre, a Natureza fornecia todas as possibilidades para que um dado grupo, através da sua ação empreendedora constante e cumulativa, produzisse técnicas, hábitos, usos e costumes que lhe permitissem reproduzir-se socialmente.
Foi justamente a esse conjunto de técnicas e costumes, supostamente definidor dos traços culturais de cada grupo social, que La Blache atribuiu a designação de gênero de vida, um atributo que, em uma condição de equilíbrio entre população e recursos, tenderia a reproduzir-se da mesma maneira, ad eternum.
Em outras palavras, um dado grupo, vivendo sem pressões demográficas e com acesso irrestrito aos recursos necessários à sua manutenção, não teria por que buscar avanços, já que não havia problemas a serem solucionados. O grupo estaria, assim, condenado a viver “imerso em localismo” ou, sem o menor eufemismo, na mais rústica e bárbara condição de vida.
Os fatores que levariam à superação daquele estágio sociocultural mais básico seriam a escassez de recursos, que levaria o grupo a um aprimoramento das técnicas para obtenção de maior produtividade na sua busca, o crescimento populacional, impelindo o grupo tanto à solução anteriormente aventada quanto à sua própria divisão, criando-se novos núcleos, e, por fim, o contato com outros gêneros de vida mais avançados.
Esta última condição era, para La Blache, o elemento-chave do progresso da humanidade, pois, através do estabelecimento de contatos duradouros com culturas mais “desenvolvidas”, grupos mais rústicos teriam a oportunidade de conhecer hábitos e técnicas que lhes permitissem, enfim, tornarem-se verdadeiras civilizações.
Partindo da premissa de que a cultura e as tradições de um grupo são um dado ao qual se pode atribuir qualificações de superioridade e inferioridade, Paul Vidal de La Blache proporcionou ao Estado francês o discurso de legitimação necessário à ação colonizadora que empreendia no Caribe, África e na Ásia ao longo do século XIX.
Significa afirmar que, aos olhos do eminente cientista e das elites hegemônicas do seu país, toda a espoliação promovida pela devastadora ação imperialista francesa teria sido, na verdade, um ato de altruísmo. A impiedosa dominação de territórios pela França deveria ser encarada, portanto, como a concessão de uma oportunidade única aos dominados de, enfim, viverem as comodidades permitidas apenas às sociedades civilizadas.
Com o passar dos anos, porém, novos discursos tomaram lugar no pensamento científico e as idéias professadas por La Blache foram superadas, seja através do reconhecimento do papel pouco nobre que a sua teoria desempenhou no projeto colonizador europeu ou, mais recentemente, por meio da busca de novos paradigmas que pregam a liberdade plena do Homem como condição fundamental para se atingir o Desenvolvimento.
Desta forma, reconhecer a necessidade de implantar um processo civilizatório na sociedade deve passar pelo imperativo de devolver ao conceito de Civilização a sua idéia original, definindo-a através de parâmetros relativos ao progresso social, político, artístico-cultural e econômico (mas não apenas econômico) de um grupo social complexo, uno e múltiplo em sua essência.
Sendo assim, não há por que agradecer ao buana dos cerrados baianos por nos ter ensinado a beber vinho seco sem acrescentar adoçante. Afinal, ser civilizado é mais que isso.
Foi justamente a esse conjunto de técnicas e costumes, supostamente definidor dos traços culturais de cada grupo social, que La Blache atribuiu a designação de gênero de vida, um atributo que, em uma condição de equilíbrio entre população e recursos, tenderia a reproduzir-se da mesma maneira, ad eternum.
Em outras palavras, um dado grupo, vivendo sem pressões demográficas e com acesso irrestrito aos recursos necessários à sua manutenção, não teria por que buscar avanços, já que não havia problemas a serem solucionados. O grupo estaria, assim, condenado a viver “imerso em localismo” ou, sem o menor eufemismo, na mais rústica e bárbara condição de vida.
Os fatores que levariam à superação daquele estágio sociocultural mais básico seriam a escassez de recursos, que levaria o grupo a um aprimoramento das técnicas para obtenção de maior produtividade na sua busca, o crescimento populacional, impelindo o grupo tanto à solução anteriormente aventada quanto à sua própria divisão, criando-se novos núcleos, e, por fim, o contato com outros gêneros de vida mais avançados.
Esta última condição era, para La Blache, o elemento-chave do progresso da humanidade, pois, através do estabelecimento de contatos duradouros com culturas mais “desenvolvidas”, grupos mais rústicos teriam a oportunidade de conhecer hábitos e técnicas que lhes permitissem, enfim, tornarem-se verdadeiras civilizações.
Partindo da premissa de que a cultura e as tradições de um grupo são um dado ao qual se pode atribuir qualificações de superioridade e inferioridade, Paul Vidal de La Blache proporcionou ao Estado francês o discurso de legitimação necessário à ação colonizadora que empreendia no Caribe, África e na Ásia ao longo do século XIX.
Significa afirmar que, aos olhos do eminente cientista e das elites hegemônicas do seu país, toda a espoliação promovida pela devastadora ação imperialista francesa teria sido, na verdade, um ato de altruísmo. A impiedosa dominação de territórios pela França deveria ser encarada, portanto, como a concessão de uma oportunidade única aos dominados de, enfim, viverem as comodidades permitidas apenas às sociedades civilizadas.
Com o passar dos anos, porém, novos discursos tomaram lugar no pensamento científico e as idéias professadas por La Blache foram superadas, seja através do reconhecimento do papel pouco nobre que a sua teoria desempenhou no projeto colonizador europeu ou, mais recentemente, por meio da busca de novos paradigmas que pregam a liberdade plena do Homem como condição fundamental para se atingir o Desenvolvimento.
Desta forma, reconhecer a necessidade de implantar um processo civilizatório na sociedade deve passar pelo imperativo de devolver ao conceito de Civilização a sua idéia original, definindo-a através de parâmetros relativos ao progresso social, político, artístico-cultural e econômico (mas não apenas econômico) de um grupo social complexo, uno e múltiplo em sua essência.
Sendo assim, não há por que agradecer ao buana dos cerrados baianos por nos ter ensinado a beber vinho seco sem acrescentar adoçante. Afinal, ser civilizado é mais que isso.
Por Paulo Roberto Baqueiro Brandão