terça-feira, 29 de junho de 2010

"O Que Significam as Atuais Alterações no Plano Diretor de Barreiras? Parte II", por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

No post anterior, buscamos contextualizar algumas das transformações pelas quais Barreiras passou nas últimas décadas, a sua importância em uma escala urbano-regional e a implantação do Plano Diretor Urbano, o instrumento máximo que visa garantir o desenvolvimento urbano autêntico na cidade.

Eis que, contrariando os princípios anteriormente relatados e aos grandes teóricos dos estudos sobre as cidades, a Câmara de Vereadores de Barreiras, através da Comissão de Planejamento, Trânsito e Obras, propõe duas mudanças no Plano Diretor do município visando (a) alterar o modelo vigente de parcelamento do solo e (b) a altura máxima das edificações, que passa dos atuais sete para trinta (!) andares.

O primeiro aspecto a ser questionado sobre as mudanças propostas diz respeito às discussões que antecederam à própria decisão de alterar o Plano barreirense. No sítio web da Câmara de Vereadores há uma nota publicada no dia 30 de março de 2010, com o título PDU de Barreiras sofrerá mudanças, na qual se informa o seguinte: “A Comissão de Planejamento da Câmara se reuniu com os representantes do setor imobiliário, construção civil, técnicos da prefeitura e do CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) para discutir o PDU de Barreiras”.

A proposta, como divulgado pelo sítio web da Câmara de Vereadores, diz respeito às alterações na altura máxima das edificações e no tamanho dos lotes, que será reduzido dos atuais 360 m2 para 125 m2.

A Lei de Parcelamento do Solo regulamenta como a cidade será ocupada, bem como a intensidade de sua ocupação. Com a alteração que se está propondo, importantes impactos serão sentidos no Meio Ambiente urbano, bem como na dinâmica socioespacial, com incidência direta sobre a especulação imobiliária.

Os impactos ambientais que podem ser relatados com o aumento significativo da altura máxima das edificações estão relacionados à formação de ilhas de calor, aumento da temperatura do ar, concentração de gases poluentes, baixa dispersão de aerossóis, aumento nos casos de doenças respiratórias, desconforto térmico, aumento de precipitações, dentre outros.

Pode ser visualizado por meio da Figura 1 um esquema ilustrativo de como é o atual limite das edificações (sete pavimentos), bem como do limite proposto pela alteração da Lei de Parcelamento do Solo (30 pavimentos).

Figura 1. Aumento do limite para edificações.

Adotando, em média, que para cada pavimento há uma altura aproximada de 3 (três) metros, o limite do atual PDU é de aproximadamente 21 (vinte e um) metros. Porém, a alteração propõe que este limite passe para 30 pavimentos, o que corresponderia aproximadamente a 90 (noventa) metros.

Desta forma, em Barreiras, após aprovada esta modificação, muitas das edificações que estão fora da legislação urbanística atual seriam contempladas com a legalidade, bem como poderemos ver a cada dia, mais e mais edificações com alturas exorbitantes para o padrão de ocupação de Barreiras.

Assim, com este aumento da altura das edificações a circulação na baixa atmosfera será alterada sensivelmente, pois haverá maiores impedimentos a circulação de ventos.
Desta forma, impactos associados à formação de ilhas de calor começarão a preocupar a população residente na cidade de Barreiras, visto que, haverá maiores amplitudes entre os registros das temperaturas máxima e mínima. Esta diferença de temperatura do ar ocorrerá em diferentes localidades dentro da cidade de Barreiras, ocasionando a formação de regiões mais quentes, nas áreas centrais, e mais amenas em bairros periféricos.

Com a formação de ilhas de calor, devido ao aumento do limite das edificações, haverá também uma maior dificuldade de dispersão de aerossóis e gases poluentes nestas áreas. Na Figura 2 pode-se observar um esquema ilustrativo deste comportamento.

Figura 2. Dificuldade de dispersão de aerossóis e gases poluentes.

Os aerossóis são caracterizados como partículas de poeira em suspensão, sendo grosseiramente identificados quando nota-se ao horizonte, uma coloração “meio avermelhada” no ar. Já os gases poluentes são caracterizados, em sua maioria, como sendo provenientes da queima de combustíveis fósseis, como por exemplo, gasolina, álcool e diesel. Caracterizam-se como os principais gases poluentes o dióxido de carbono (CO2), ozônio (O3) e metano (CH4), lançados na atmosfera por automóveis e indústrias, principalmente.

Esta baixa dispersão de aerossóis e gases poluentes, provocada pela altura das edificações, fará que em épocas de baixa umidade, caracterizadas pela baixa pluviosidade, ocorram mais registros de doenças das vias respiratórias (rinite, asma, bronquite, sinusite, etc.) na população barreirense, sendo os grupos de maiores incidências as crianças e idosos.

Se não bastasse o descrito anteriormente, haverá aumento no desconforto térmico e alterações expressivas nos índices pluviométricos na cidade de Barreiras. É fato que a formação de ilhas de calor, devido à intensificação do uso do solo e outros fatores potencializam o desconforto térmico a população.

Este desconforto térmico, ocasionado pela construção de “barreiras” à circulação, proporciona pouca reaeração da baixa atmosfera, aliado a gradativa redução de áreas verdes acaba, pois gerando um ciclo vicioso bastante perigoso e oneroso à população barreirense.

Por outro lado, há comprovadamente aumento nos índices pluviométricos (chuva) com a formação de ilhas de calor e aumento de aerossóis em suspensão. Esta situação gerará impactos relacionados ao aumento do risco a alagamentos, devido a baixa eficiência de drenagem urbana no município.

(CONTINUA)...
Por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

segunda-feira, 14 de junho de 2010

"Quem Vai Rogar por Nós?", por Márcio Lima

Há hoje no Brasil uma discussão sobre uma suposta politização excessiva do Poder Judiciário. Recentemente, temos assistido a muitas interferências da justiça no processo político, as quais tiveram sua máxima expressão na cassação dos mandatos dos governadores da Paraíba, Cássio Cunha Lima, do PSDB, e do Maranhão, Jackson Lago, do PDT. O Maranhão é o Maranhão. Assim, é mesmo de desconfiar quando um juiz devolve à família Sarney o poder perdido nas urnas.

É precisamente essa suposta politização do Judiciário que políticos com problemas com a lei têm invocado, antes de tudo, para se defenderem. Em geral, essa defesa é sintetizada na frase melíflua de que os políticos tanto gostam: “sou vítima de perseguição”. Não seria diferente com Jusmari. Já é a segunda vez que ela é cassada e reconduzida ao cargo de prefeita. Mas é bom lembrar que, em 2007, quando ainda era deputada, a atual chefe do executivo também esteve prestes a perder o mandato, isso por conta da lei de fidelidade partidária. Ela havia deixado o DEM para filiar-se ao seu atual partido, o PR. Como agora, a própria justiça preservou o mandato da então deputada, salva na ocasião por uma anistia geral. Como agora, sua tese principal de defesa era a perseguição.

Por que o DEM estaria perseguindo Jusmari? Ora, sem dúvida que a morte de ACM em 2007 contribuiu para erodir a coesão política que havia em torno do ex-governador e ex-todo poderoso da Bahia. No entanto, já as eleições de 2006 prenunciaram o enfraquecimento do DEM, pois muitos integrantes deixaram o partido, como foi o caso do também ex-governador César Borges, que se filiou ao PR. O partido viu, assim, muitos nomes de suas fileiras trocando de legenda. Em alguns casos, como o de Jusmari, não houve apenas troca de partido, mas mudança de alianças.

Como não poderia deixar de ser, há em Barreiras uma tentativa de fazer descer goela abaixo o discurso de que depois de dezesseis anos de poder nas mãos da família Pedrosa, há uma ruptura, que se desenvolve em harmonia com a mudança ocorrida nas esferas estaduais, com a eleição, em 2006, do Governador Jaques Wagner. A Bahia e Barreiras teriam infligido, nas últimas eleições, mudanças nos seus rumos. Se lá em cima ACM e seus prosélitos perderam o poder, aqui embaixo Saulo e Antônio Henrique foram destituídos. Jusmari, como se estivesse sempre do lado oposto ao de ACM, surge como arauto da mudança política barreirense.

Desconheço o posicionamento de Antônio Henrique quando prefeito, se era aliado ou oposição a ACM, mas tenho notícias de que Saulo sempre fora oposição, ao contrário de Jusmari, pertencente aos quadros do carlismo. Nunca é demais lembrar que seu marido, Oziel Oliveira, governou por oito anos Luís Eduardo Magalhães, acontecimento que pode ser o exemplo maior da união pretérita de uma outra família com os “antigos donos do poder”. Desconfio, portanto, do discurso segundo o qual um novo tempo tenha começado para Barreiras e para Bahia, erguido sobre as cinzas do carlismo. Aqui, essa nova época não está sendo conduzida por uma antiga aliada, amiga agora dos que estão no poder? Não é de admirar que se o DEM voltar a governar a Bahia, e o PSDB o Brasil, muitos se tornarem outra vez da base aliada dos novos governantes. Também não se sustenta o discurso de perseguição política. Até porque até o momento Jusmari se livrou das cassações. Só poderíamos falar de politização do judiciário em escala regional se o mesmo juiz, diante das mesmas infrações que o levaram a cassar a prefeita, fizesse vistas grossas ao sucessor de Jusmari.

O caso é que a “primeira prefeita” e “prefeita de primeira” está de volta, assim como o governo “cidade mãe” restabelecido. Já tive oportunidade de comentar os slogans políticos da atual administração aqui. Mas é surpreendente como esses bordões exprimem tão bem a obra do atual governo. Ora, a prefeita de primeira, tão-logo tomou posse, fez valer suas palavras. Mas, em vez de botar a cidade para frente, colocou no ponto morto. Não satisfeita, fez da marcha a ré o ritmo de seu governo. E o que parecia impossível tornou-se fato: Barreiras ficou ainda pior. O que nos faz pensar no outro slogan: que tipo de mãe é essa cidade? Só consigo lembrar-me de Medeia. Na mitologia grega, Medeia é aquela que mata os filhos para vingar-se do marido Jasão. Não sei de quem a cidade mãe quer vingar-se, embora seja evidente que seus filhos é que estão pagando a conta da vingança. E agora, quem vai rogar por nós?

Por Márcio Lima

terça-feira, 8 de junho de 2010

"O Que Significam as Atuais Alterações no Plano Diretor de Barreiras? Parte I", por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf

Maior cidade do Oeste Baiano, Barreiras possui cerca de 140 mil habitantes, sendo considerada por muitos a “capital” informal do Além São Francisco. De fato, a urbe barreirense exerce considerável influência sobre as demais da região, encabeçando uma rede urbana de caráter interestadual que engloba parte da Bahia, sul do Piauí e leste do Tocantins.

Neste sentido, como apontado pelo REGIC (Regiões de Influência das Cidades), documento elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas que busca definir a hierarquia dos centros brasileiros e as suas regiões de influência, Barreiras é considerada um “centro regional” ou, dito de outra forma, uma cidade média.

Uma cidade média, de forma geral, é aquela que possui um considerável contingente populacional e que, devido à diversidade e força das suas funções urbanas, exerce centralidade frente às demais nucleações de uma região, ainda que esteja subordinada por uma urbe maior, normalmente uma metrópole.

Ora, qualquer um que tente aplicar as variáveis apresentadas ao caso de Barreiras irá constatar que todas cabem à cidade oestina. Portanto, não é nada difícil concluir que se está tratando de uma cidade importante e, por que não dizer, rica.

Ocorre que, para atingir a condição de centro regional que ostenta atualmente, um preço alto foi cobrado a esta cidade.

Se a centralidade de Barreiras no Oeste Baiano já se desenhava desde tempos idos, substituindo gradativamente a cidade de Barra no seu papel de entroncamento mercantil, foi a partir da introdução das modernas técnicas de produção agrícola na região que tal situação se fez realidade.

Assim, visando atender principalmente às necessidades geradas pelos agentes econômicos que passaram a atuar no Oeste Baiano, Barreiras consolidou a sua condição de (a) centro terciário, com a abertura de empreendimentos comerciais e de serviços, muitos deles voltados ao atendimento de demandas do campo; (b) difusor de inovações, graças principalmente à criação de instituições de ensino superior e, ao menos regionalmente, de; (c) centro de gestão do território, devido à abertura de escritórios de órgãos públicos que atuam nas esferas estadual e federal.

Todas estas transformações produziram benefícios para a cidade, cada vez mais moderna. Mas produziram também uma escalada vertiginosa de problemas que são típicos das cidades cujo crescimento populacional acelerado não é acompanhado por políticas públicas que provenham este contingente dos serviços básicos que necessitam.

Só para lembrar, a cidade de Barreiras, que na década de 1970 possuía algo em torno de 9,5 mil habitantes, teve a sua população multiplicada diversas vezes, até atingir os números atuais. Isto em um lapso de 40 anos!!

A mancha urbana se expandiu e novas moradias, empreendimentos comerciais, escritórios e instituições foram incorporados à paisagem de Barreiras, mas não sem conflitos e contradições. A fragmentação socioespacial se ampliou com o processo de periferização, a ocupação de encostas e a falta de saneamento básico resultaram em graves conseqüências para o Meio Ambiente urbano, além dos problemas referentes ao transporte público, especulação imobiliária e de gestão pública, entre outros.

Assim, o importante centro regional do Oeste Baiano, propulsor da economia de um vasto território e prenhe de funções urbanas, é também o locus de problemas dignos das grandes metrópoles brasileiras.

Para reverter tal quadro – ao menos em tese – e atendendo ao preconizado no Estatuto das Cidades, a municipalidade de Barreiras promoveu, na década de 1990 (com atualização em 2003), a elaboração do seu Plano Diretor, o documento-base que institui a política de Desenvolvimento Urbano de todos os municípios brasileiros com população igual ou superior a 20 mil habitantes.

Neste documento devem constar, entre outros temas, as políticas públicas que visem combater a especulação imobiliária, reduzir o nível de disparidade socioespacial intraurbana e democratizar o planejamento e a gestão do espaço urbano. Mais ainda: o Plano Diretor deve ser o alicerce de um projeto amplo de Reforma Urbana que promova o desenvolvimento autêntico da cidade, sem metáforas e sofismas.
(CONTINUA)...

Por Paulo Baqueiro e Marcelo Latuf